quarta-feira, 8 de janeiro de 2014

(os passos que eu não dei) quem precisa do brasil

quando não estou escrevendo, me sinto no marasmo total. mesmo com o dia cheio de trabalho, faculdade, comida e pessoas, é como se estivesse parado vendo a cidade em horário de pico, e eu ali, me perguntando de onde vem tanta gente, com meu cabelo mal penteado, a barba por fazer e um cigarro queimando torto na boca - assim, bem clichê. Porque é assim que eu me sinto sem escrever. Um clichê, um esboço, em engodo.

entediado e blasfemando 'que saco', desço a via com os olhos vermelhos e a cabeça a mil. ouço noticias de amigos distantes que me confortam. vejo rostos amigos que me distraem. ouço todo som que essa cidade produz, mas já não ouço de um ouvido mais. tudo me soa esperança, inclusive minha vontade de escrever o amor. eu não sei o quão conturbado pode ser, mas o que teria sido de mim se tivesse ouvido a zoé? ou qualquer canção que me levasse a chorar. ouço noticias sobre meu país que me sufocam mais do que a garganta seca em dia de verão. ouço meu pai revoltado em casa querendo matar ministro a tamancadas. não é que já é verão. a sociedade civil ocupa o que é de todos, e as crianças choram no ouvido de ninguém.

esse tempo todo passei juntando retalho de brigas passadas, batendo a cabeça na mesa, tropeçando em estranhos na rua, sofrendo um pouco sem querer, vendo meu time perder. gritar é pra quem tem voz, eu sou só um desafinado qualquer. canto samba tímido no quarto e para poucos e bons amigos. mas o que eu quero te dizer, é que a coisa aqui ta preta. esse vai ser um texto inacabado, pois meu mundo nunca vai caber nesse mundo que vocês conhecem. somente meus abraços, apertos de mão, beijos, olhares e minhas duvidas vão me expressar.

percebe? é tanta coisa pra viver que sobra pouco. me sobram socos que eu queria dar. me faltam pés pra chegar em qualquer lugar. eu penso sempre em sair daqui, mas olho o horizonte de qualquer esquina, e essa vista me prende mais do que ancora no cais. a partir daqui conto o que eu não vivi, porque assim como escolhi sorrir, um dia eu escolhi ficar.

terça-feira, 26 de novembro de 2013

os três acordes de evelyn e adam grey

a noite eu troco de canal
como se eu visse algo que eu
não tenha visto outra vez
o cansaço me disfarça o tédio

durmo e quando eu durmo mal
é como se eu pudesse escolher
sonhar ou não
a poeira já me cobre o terno

e nada disso eu vejo passar
o relógio me ultrapassa assim
e tudo isso eu sei que é normal
encontro o que me importa

de manhã assisto o jornal
o mundo explode na minha cara de
quem não sabe muito o que fazer
o sol vem acordar meu prédio

saio e é tudo tão igual
a cidade me rejeita como febre
atirar ou não
eu não posso estar falando sério

e tudo isso tem que acabar
algum carro me atropela enfim
jogo tudo isso inteiro pro ar
não há nada aqui que importa

mas hoje já são quase seis
e eu me sinto tão bem
mas hoje eu sei é minha vez
e eu já me sinto tão bem
mas hoje eu sei que eu não sei
e vai ficar tudo bem

mas hoje eu minto sem porque
e já passaram das seis

sexta-feira, 8 de novembro de 2013

a poeira dos outros

todas as inquietações da alma
nuas e expostas ao vento
tatuadas em papel a4
penduradas por barbantes
perduradas em nós
nuas tomam banho de sol
a espera da chuva
junto com os prédios
as árvores e toda essa gente
essa gente toda

a poeira dos outros
escondida em baixo dos tapetes
envolto por móveis
escondido por tijolos
colocados a mil
aos milhões de tijolos

a poeira dos outros
espalhadas pelas empregadas
no ponto de ônibus
nuas se despem em palavras
como quem diz
essa gente é gente também
apesar do que tem
apesar do que não tem

a poeira dos outros nunca convém

segunda-feira, 21 de outubro de 2013

refém

o sangue lá dentro sendo roubado por fora
sensação que aflora de eterna euforia
qualquer dia eu explico o espaço entre o céu
e as nuvens rodando sem encontrar o réu
que roubou
e matou
e levou embora maria

ainda sinto a sensação de impotência nas mãos
e a criação de tamanha desesperança
no que quer que poderia ter evitado
e inventado a dor

dor do tamanho dos edifícios
que tampam e nauseiam minha visão
dor que não só dói como bambeia as pernas
e bombeia o sangue de maneira estranha
sem sentido mais
passa o coração vazio e faz um som de eco
que acorda a vizinhança inteira
em um pedido involuntário de socorro
socorre maria de mim
sou pobre de nobre pedaço de alma
e um rim que funciona a benção
de nossa senhora de sabe-se lá o meu fim

domingo, 13 de outubro de 2013

as goteiras do meu prédio

gostei do seu cheiro sem perfume
que tirou o azedume da semana inteira
e deixou em chamas minha respiração
que eu tentei disfarçar contando casos besteiras
sem saber o que dizer pra não pular no teu colo
e logo minha bochecha estava rubra de frio e álcool
combinando com o tom da sua pela morena
e seu jeito de falar sobre a cidade
que eu não conhecia até você mostrar
com sua visão de rapaz alto
a cabeça deve chegar nas nuvens
e que aposto que voa ao me beijar

foi quando de repente seus olhos tropeçaram nos meus
eu os fechei com força sem saber o que pensar
e agora ardia nas faces rosa
e sua mão apertou mais forte meu quadril
que você gentilmente se acachou para eu me encostar

mesmo assim fiquei na ponta dos pés
pra te alcançar e não me perder
eu sempre me perco quando gosto de você
amanheço cantando elis como se ela não tivesse partido assim
sem saber
o que era amor, o que vou fazer

se não me perco te perco
se te perco me perco entre
uma e outra noite que se vai
despercebida
madruga a dentro
dia a fora
vida la fora
que me trai

sábado, 31 de agosto de 2013

Capitulo I

As 5 da manhã eu ouço não só as batidas do meu coração compassadas em ritmo de bossa nova como ouço o barulho do fluxo do meu sangue subindo e descendo pelas minhas veias. Estou deitada na minha cama e o teto parece mais baixo que o normal, mas eu não sinto medo. Eu esperava que alguma coisa acontecesse. Na verdade esperava um momento revelador – a hora, a data, o local e o motivo – que me levava a ser como eu era; perdida no meio de tantos encontros e desencontros, que aconteciam no meio do nada que eram esses encontros. Eu achei que nesse exato momento eu entenderia porque eu estava aqui, drogada e o porque minha memória (vida) parecia tão longe do momento agora.
Eu tinha um caminho, e desviei até aqui.
Foi como se eu estivesse em um carro seguindo a mesma auto estrada por dezoito anos, e havia uma bifurcação. Esquerda e direita, não havia um meio termo. Era como a angustia da separação, mas de mim mesma. Era como a sorte da indecisão, o azar da escolha e o meu corpo um inteiro, não uma fração. O meu sorriso era loteria, o resultado final. Meu devaneio era o resto, o que ficou pra trás. Um dia eu voltaria se ainda existisse volta. Se não houvesse contramão. Mas o carro seguia, os dias passavam.
Era tudo um jogo mal jogado por mim, que não sabia chutar. O galo da vizinha canta, e eu não sei que horas são, pela primeira vez em meses. Começo a rir de euforia e desespero. Não saber as horas me da a sensação de não saber em que lugar da vida eu estou, e agora me dou conta que não sei do dia, do mês e da semana. Mas nunca me esqueço do ano, porque eu queria me chamar Ana. Lembro de desejar ser Ana a 8 anos atrás, na primeira vez em que a estrada bifurcou. Naqueles dias em que o asfalto hora curvava para um lado, hora curvava para o outro, lembro de estar no banheiro da casa da minha avó após o ano novo, depois da vida nova, e a minha tia me mandava prestar atenção com a voz alta que preenchia meus ouvidos amplificada pela excelente acustica do banheiro. Ela dizia “você vem de uma família de fracassados, você precisa ser feliz, entendeu?” Naquela época eu tinha medo de olhar nos olhos das pessoas, e até hoje conto nos dedos as pessoas que olhei nos olhos, mas eu me lembro de olhar no fundo dos olhos dela, no susto e no impulso. Eu não me lembro de ter respondido, mas me lembro de ter escovado os dentes olhando fundo nos meus olhos. Eu queria fazer isso agora então vou me levantar e procurar no espelho se eu sou feliz. Tenho mil argumentos pra provar que sim, mil sentimentos pra dizer que não. E uma vida inteira pra não saber responder.
A estrada bifurcou de novo, no mesmo lugar, na mesma direção. Eu tremo de ansiedade porque tentar é morrer e viver, tudo ao mesmo tempo, no mesmo segundo em que respiro. O carro segue a 150 por hora, e o que eu vou fazer da minha escolha é tudo um jogo mal jogado por mim, que não sei defender. Eu não sei me mover sem saber. Quando não sei machuco. Machuco a mim e ao mundo. E ao criado mudo que sempre chuto quando levanto correndo. E agora me preocupo porque eu não sei mais andar devagar. Porque necessariamente eu corro eu direção a bifurcação? Quando eu estou na esquerda olho as janelas da rua, desejando subir prédios. Quando estou na direita, olho as ruas da janela desejando cair no asfalto, fazer barulho e machucado. Sinto uma ponta de inveja das pessoas decididas que sabem onde vão. Sinto um baseado inteiro de tédio de saber o que esperar. Eu canso de saber, me mato de esperar. Me canso de viver, me mato de sonhar. Começo a não acreditar nas pessoas decididas que não olham pro lado, não olham pra trás. Não queriam que fosse diferente o café da manhã. Não queriam que fosse diferente a roupa do dia, ou queriam estar transando no escritório com a secretária. Eu pensei isso tão forte que esqueci de respirar e segurei com força o lençol, e me dei conta que não enxergava o teto mais.
Eu sai de mim pra não ter que escolher. Esquerda ou direita, matar ou viver. E pra não ter que escolher, eu sai do carro em movimento, e deixei que ele fosse mato a dentro, e nunca mais o vi. Parei no meio da estrada, exatamente no meio, e decidi pegar carona no primeiro carro que passasse. Ou ele pararia ou ele passaria por cima de mim. A escolha que eu fiz, o contexto em que eu vivi, as pessoas com quem sorri, todos os dias desde que eu nasci. O mundo girou pra lá e pra cá, em torno do sol, puxando a lua, choveu, ventou, não nevou, estiou, e tudo, extremamente tudo me desviou até aqui.
Adormeci.
Acordei e não tive resposta. Fiz um café pra variar. Abri a porta da varanda e o sol estava lá, pra variar. A vizinha estendia roupa no varal, pra variar. As crianças choravam, pra variar. Eu não achava meus óculos, pra variar. Coloquei um disco do Chico pra variar. Sentei com um cigarro, pra variar. Apoiei minha cabeça na mão e suspirei desiludida pra variar. Mastiguei uns biscoitos enquanto olhava a vizinhança, pra variar. Quando notei no canto direito da minha visão uma roupa diferente, um sorriso diferente. Enquanto Chico cantava “deixa em paz meu coração” eu fiz um almoço diferente, e me senti diferente, como se não precisasse jogar. Como mesmo se eu virasse a esquerda, lá na frente eu pudesse virar a direita. Como mesmo se eu não pudesse mais virar, a estrada se faria certa em um tempo ou outro. Eu nunca gostei de placas me mostrando aonde ir. Foi assim que escureceu, foi assim que eu venci.

sexta-feira, 2 de agosto de 2013

joão

trago estrelas
respiro fumaça
neblina me cega
o medo me mata

dia após dia
noite após tarde
um pé atravessa
o outro milagre

trago estrelas
sinal amarelo
cortina fechada
ilumina concreto

sentido contrário
mão contra mão
mudo de aquário
não diz nada não


trago estrelas
dia após dia
respiro fumaça
noite após tarde

neblina me cega
um pé atravessa
o medo me mata
outro milagre

trago estrelas
sentido contrário
sinal amarelo
mão e contra mão

cortina fechada
mudo de aquário
ilumina concreto
não diz nada não