segunda-feira, 10 de dezembro de 2012

balanço I

desde pequeno, todo esse drama ao meu redor nunca fez muito sentido pra mim. mesmo quando meus pais se separaram, eu realmente não queria saber o motivo, eu estava bem. mas minha mãe insistia em me levar ao psicologo as quintas feiras como se eu tivesse algum problema. no começo foi divertido toda a atenção e as brincadeiras mas depois eu me cansei e não queria mais, mas não me deixaram parar de ir. até o dia em que fiquei parado na sala de espera sozinho olhando pro teto até decidir ir embora pra nunca mais voltar.

eu realmente não me importava.

eu não gostava do meu pai na época, sempre tão rígido com suas regras e lições. ele só ficava legal quando bebia, mesmo assim correndo o risco de haver uma briga com minha mãe por motivos que eu sempre desconhecia. ele bebia bastante nos finais de semana e aos domingos pela manhã tocava caetano pra mim e tentava me ensinar a tocar. eu não queria aprender, eu não sei se era a pouca idade ou o fato de eu não me sentir bem perto dele.

eu só queria correr.

ele só queria seu violão, sua pinga, um filho pra ensinar as coisas da vida. contar histórias e falar sobre os anos 70 e 80 e namorar no final da tarde no sofá de baixo das cobertas, mas não era assim. a resposta do mundo era cobrança. eram as contas pra pagar era a mulher pedindo dinheiro e a mãe que não queria o filho que ele não queria ser. queria cantar as coisas bonitas da américa mas parecia que a américa só queria reclamar. ele só queria alguém que o ouvisse de verdade e parasse de contar as horas pra tudo. mas ele tinha um filho pra criar. ele era um filho pra ser. um marido pra tentar

ele só queria correr.

o mundo desmoronou pra família. sem emprego, com cobrança, sem amor, com aliança. eu brincava com os meus bonecos com os ouvidos atentos a tudo que acontecia na casa, e olhava pela janela esperando meu aniversário chegar, pra ter a sensação que esta tudo bem de novo. eu tinha uma irmã agora, tudo tinha que ficar bem de novo. era estranho aquele silêncio no jantar. o medo aumentava e os gritos também.

ele saía do elevador quando outra pessoa entrava pra não ter que conversar

eu fui alheio a guerra. não me lembro quando mas fui morar com minha avó. eu aprendi a andar de ônibus e nunca mais veria meus amigos de infância. meu primeiro beijo, meu primeiro time, meu primeiro gol, meu primeiro videogame, minha primeira vida. o futebol na rua e o pique-esconde quando a luz acabava. o final da rua que dava em um corrêgo e a linha do trem. o escolar que sempre me trazia no mesmo horário, todos os dias. mesmo quando estava doente e não ia a aula eu aparecia na esquina pra acenar para o senhor que eu não me lembro o nome mas que o rosto não me sai da memoria.

rua saldanha da gama, 256, belo horizonte, brasil

havia um telefone antigo no canto da sala, daqueles que você tem que girar a tecla pra baixo pra discar. era verde claro e estava sempre brilhando. eu fui obrigado a crescer e deixar ele pra trás. eu fui sendo levado e ninguém que me levou sabe pelo que ou porque. eu simplesmente estava subindo a rua com a mochila nas costas. a minha mãe chorava enquanto eu visitava meu pai nos finais de semana em um bairro próximo de onde eu tinha saído.

não lembro de nenhuma explicação. não lembro de querer uma explicação.

todos os dias eu andava por cerca de meia hora para levar minha irmã ao colégio infantil. era 12:40 da tarde. as vezes o sol era tão forte que atravessa a rua entre os carros para chegar logo na sombra. o sol queimava minha cabeça, não me deixava pensar. arrastava minha irmã como um fardo que eu era obrigado a carregar. as vezes não trocávamos uma palavra. na minha cabeça eu criava uma história de super-heróis baseadas nas revistas que eu não parava de ler, não era pra fugir, eu não estava infeliz, mas eu só queria estar brincando com as outras crianças, que já não eram mais tão crianças assim. e eu ainda sonhava. o resto do mundo parecia que não. eu não me encontrava ali. nem em lugar nenhum.

domingo, 2 de dezembro de 2012

carrossel

eu ganho a rua e perco o senso
de direção até a rua vinte e três
me perco sempre entre a esquina e a farmacia
eu ganho sempre algo que o mundo sabe
e eu não sei

cambaleando eu chego sempre antes das cinco
pois de inteiro eu já não chego aonde eu sei
eu ganho senso e perco a rua a contragosto
sem pressa eu chego em quase tudo que eu sonhei

pra reforçar eu perco tempo e me repito
eu já não piso mais na rua vinte e três
sem graça, eu perco a cena e me demito
de pingo em pingo eu vejo tudo que eu mudei

em vai e vem clichê o tempo segue
alheio a tudo em linhas tortas de pileque
em vai e vem me deixa tonto e me esquece
o tonto segue e sem vencer desaparece

e sem direção vai pela rua vinte e três

domingo, 18 de novembro de 2012

porta

para ler ouvindo: 5 a seco - pra você dar o nome

ontem eu fui dormir e acordei com você colada no meu corpo, quase como se fizesse parte dele. eu sorri quando me dei conta mas é estranho toda vez você dizer que não sabe o que quer e pedir pra eu te esquecer dizendo que nunca mais vai voltar. e toda vez eu suspiro chateado e refaço meus planos fazendo o café da segunda-feira.
tento não me mexer na cama mas meu braço esta dormente e eu não sei o que vou dizer quando você acordar. quer dizer, eu estava bem sabe? eu sempre fico bem, eu sempre me acostumo e de meio ano pra cá eu mais dou risadas e faço apostas com os meus amigos do dia da semana ou do evento que vamos nos encontrar de novo, e você vai dizer que não mas seu sorriso e sua mão tremula vão dizer que sim e eu sempre digo pra você fazer o que seu coração mandar sem o minimo de esperança que ele dê a ordem final pra você ficar comigo. mas eu sempre quero ver onde vai dar e sempre da assim, comigo esquecendo de pedir as chaves do apartamento e do meu coração de volta.

- bom dia!
- bom dia.
- o café esta em cima da mesa.
- forte ou fraco?
- amargo.
- desculpa.
- tudo bem, pode ficar o quanto precisar.
- eu não pretendo ir embora dessa vez.
- eu acredito.
- então porque esta olhando pra janela?
- porque eu não quero acreditar.
- então porque fez tanto café?
- porque sou educado.
- então seja educado e olha pra mim!
- vai vestir uma roupa!
- pra que? você gosta do meu corpo. e já que vou ficar quero ficar à vontade.
- você sabe que não vai ficar.
- mas o tempo que eu ficar quero que seja como se eu nunca fosse embora.
- porque você faz isso?
- porque é assim que eu sei amar. se não fosse assim eu não te amaria tanto...
- você é um inferno!
- eu sei.

terça-feira, 13 de novembro de 2012

manifesto pela liberdade

Acordo todo dia as seis em ponto. Jogo a água fria no rosto, o café forte na garganta e visto a roupa ainda sonolento, quase a mesma roupa de todos os dias. Saio no vento frio e espero a condução que segue meia cidade em caos, com pessoas correndo e cuspindo fumaça. Vou em pé olhando sem vontade as poucas arvores em tanto quando falsas. Chego ao meu destino e forço um sorriso pro porteiro, pra secretária e pro estagiário. Sento na minha cadeira, tomo posse da minha mesa – que não é bem minha - alguém comprou e me deixou sentar ali. O dia passa arrastado, levanto e tomo um ar puro, estico as pernas com um café e um cigarro, indicação do medico – que também disse para eu parar com o café e com o cigarro, mas cada coisa de uma vez. Volto pra cadeira que não é muito minha, nem de ninguém.
Vem a hora do almoço e reviro a mesma comida do mesmo restaurante há um bom tempo. Peço peixe mesmo sem gostar de peixe, porque disseram que faz bem e pra eu sentir um gosto diferente na boca, mudar alguma coisa na minha vida. Depois finjo me interessar pelas manchetes dos jornais expostos na banca, e até arrisco subir a sobrancelha com a noticia de uma melhora na economia do país, enquanto fumo outro cigarro sem perceber. E sem perceber já é hora de voltar e quando eu volto, a minha cadeira que já sinto ser um pouco minha está lá, olhando pra mim como se sentisse minha falta, pronta pra arrastar o resto do dia comigo.
Como se fosse outro mês a hora de ir embora chega e tomo o caminho de volta pra minha casa que nem é tanto minha, meu pai deixou pra mim. Passo antes no supermercado pra comprar cerveja e alguma bobagem pouco nutritiva para comer. E quase as mesmas pessoas que eu vi correndo o dia inteiro estão lá, correndo outra vez. Elas parecem ser quase sempre iguais, com as mesmas caras de perdidas comentando a vida de personagens de novela como se fossem as suas, reproduzindo idéias de livros de auto-ajuda como se soubessem quem são. Pago no cartão de debito pois me esqueci de sacar dinheiro. Eu queria estar de chinelos e mais a vontade em mim.
Enfim chegando em casa, recebido por ninguém, abro uma cerveja, bolo um baseado, ouço a Janis gritando no ultimo volume e me deixo esquecer. Assisto um desenho animado que me faz falta de uma porção de coisas e no intervalo, uma propaganda de um pacote turístico para 15 dias para Santa Clara, no Peru. Eu poderia citar mil e um fatores desse dia, incluindo a erva, para que eu arrumasse as minhas malas e partisse, mas não sei nenhum no momento. Anexo a esse manifesto de mim para mim mesmo, deixo uma procuração passando todos os meus bens á minha psiquiatra Luiza Maria Machado que me orientou a escrever sobre meu dia e encontrar o motivo do meu problema para dormir. O problema era eu mesmo e a vida que eu escolhi viver. Problema essa que estou concertando agora.

quinta-feira, 18 de outubro de 2012

afobação

para ler ouvindo: chico buarque - sem você 2

quando procuro um nome na agenda do meu celular com suas iniciais e não vejo seu nome no topo, sinto como se tivesse que lembrar alguma coisa impossível de esquecer, mas eu não lembro. da um branco na cabeça e no coração, e uma pontada de ansiedade na boca do estomago. tento escrever alguma coisa quando vejo uma garota com o mesmo penteado que o seu, que me lembra alguém que não está na minha memória, nem nas minhas fotos mais recentes. entre amigos, quando alguém conta um caso parecido com o que vivemos e eu tento contar a nossa história eu me perco no meio porque não me lembro o final, porque não sei se o começo e o meio realmente aconteceram ou estou apenas inventando pra fingir experiência. mas se parecem com recordações ou algo assim. esses dias até achei um quadro que não me lembro de ter comprado, se quer faço ideia de onde veio. percebe o que esta acontecendo? lembrar e esquecer já se tornou tão banal que mal vejo a diferença entre os dois. nem ao menos sei pra quem estou escrevendo isso tudo. se eu lembrar te conto com calma em uma outra temporada qualquer.

sábado, 13 de outubro de 2012

das palavras que eu mais gosto

de todos os sentidos do corpo humano
os que eu mais gosto de sentir é o que eu sinto com os pés
os pés na parede fria, no chão gelado,
no asfalto quente. na terra fofa,
na areira seca, no mar incerto.
o chute na bola, a força no pedal,
o impulso pra correr, o salto mortal.

falo como se eu não gostasse dos dedos,
dos cachos do cabelo,
do bico do seio,
das cordas de violão,
dos anseios.

tem meus olhos que já não enxergam tão bem
mas ainda vejo sorridente
o mar transparente
o céu azul
a serra verde
o meu amor que reluz

vez ou outra meu nariz coça
não sinto o cheiro de nada
mas o perfume da moça
o suor do trabalho
a bonina nascendo
e o café fresquinho
eu sinto o cheiro de cor

mordo a língua pra falar de receio
quando sinto em outra língua que o amor já veio
eu falo de menos e sinto o recheio do doce ao amargo
que a vida me traz

das palavras que eu mais gosto
na vida com certeza á vida que me satisfaz
não falo das (palavras) que eu menos gosto
pois neste momento de vida que passa poesia
palavras que não traduzem minha alegria
eu não quero ouvir falar mais

domingo, 7 de outubro de 2012

redemoinho (ou porque eu fui embora)

ouça: vanguart - das lagrimas

eu poderia usar qualquer desculpa esfarrapada pra você não me odiar, e tentar te explicar porque eu não estava do seu lado quando acordou. seria bem mais fácil porque a verdade é difícil e complicada, tão absurda que não consigo acha-la, quanto mais escrever e explicar para que você não se sinta mal lendo isso. então saiba que tudo que você ler daqui pra frente é pura mentira pra te confortar e me ausentar da culpa pelo seus próximos dias ruins. eu vou me sentir melhor assim, e se você acreditar também será melhor pra você e todo mundo sai menos triste, porque a última verdade que escrevo aqui é que eu não vou estar completamente feliz sem você do meu lado.
então por onde começo? ah, justamente por essa parte, a parte que você de alguma maneira me fez precisar de você pra sorrir com força a ponto de machucar meu maxilar e me deixar vendida e de joelhos. de onde você tirou essa ideia de me fazer te amar? eu não nasci pra isso, quanto mais pra saber lidar com essa vontade de não ir embora. essa fase de me acomodar até com seus defeitos em detrimento de tudo que eu sonhei para meu príncipe encantado. e você esta longe de ser meu príncipe encantado porque você se quer veste calças aos domingos. você me vê nervosa da mesa de jantar e vem com esse papo de senta aqui e se aconchega.
você é o único que consegue me parar.
foi a primeira vez que eu dormi até as duas da tarde e não vi o dia passar. acho que o mundo sente falta de mim. eu vou sentir falta de você e dos seus planos absurdos que pareciam até fazer sentido quando você me contava com a empolgação de uma criança na mesa do bar. e o tempo todo eu só queria entender seu tempo e a maneira como você me faz feliz sem perceber. em algum lugar lá fora eu vou parar e perceber a grande burrada que eu fiz a qualquer momento, então eu vou rezar todos os dias para que você ainda seja meu em alguma parte da sua vida, assim como eu fui sua e nunca consegui dizer. meus olhos sempre disseram por mim e como eu desejo que você tenha ouvido quando eu gritei naquele silêncio que só você sabe fazer antes me beijar e tirar a minha roupa.
pode parecer tudo bobo e sem sentido agora mas quando você olhar pra fora da sua janela você vai entender. mas caso contrario vou estar deitada no sofá vendo tv se você precisar.

com amor, v